O texto de hoje não é de minha autoria (primeira vez em dois anos e meio de blog), mas de Renato Ricci, colunista da revista Exame.
Achei pertinente a questão proposta, que para mim, tem uma ligação com o Movimento Escoteiro, mas, gostaria de saber sua opinião também.
Afinal, somos, de certa forma, professores para muitas crianças e jovens. Porém, o somos de uma maneira muito diferente, procurando que os nossos Escoteiros nos digam o que querem aprender e nós os guiamos pelos caminhos da vida.
– Pessoal o que vocês querem aprender hoje, pergunta o jovem professor com ar de desafio.
– Ora professor, você é o professor e isso o obriga a preparar uma aula com antecedência – essa pergunta não faz sentido – irritado responde um aluno.
– Hoje vamos fazer diferente, vamos usar o tempo para aprender o que vocês tiverem interesse. Insiste o professor calmamente.
– Saí dessa cara, pirou mano? Acordei cedo pra ouvir alguma coisa, sei lá o que, manda logo… Outro aluno com ar de deboche.
– Tiago larga esse celular e me diz o que você quer aprender hoje? Brinca o professor.
– Aprender? Sei lá, o que você gostaria de ensinar? Manda aí velho – na boa, o que você escolher eu estou dentro.
O professor resolve então perguntar para a melhor aluna da classe, Mariana, o que ela gostaria de aprender.
– Professor, já que não preparou a aula, acho que poderíamos rever o nascimento do período pós moderno, ou quem sabe os efeitos do capitalismo nos países de cultura oriental, ou quem sabe…
– Para com isso, de novo não, isso já era, a prova já foi – responde irritado um colega de Mariana.
O professor novamente ataca.
– Amigos hoje vamos fazer uma aula muito diferente, que eu nunca dei antes – o tema vocês escolhem e eu desenvolvo, quem sabe com a ajuda de vocês.
– Professor, fica tranquilo, esquecer de fazer a lição de casa é a coisa mais normal do mundo, você sabe disso. A semana que vem você prepara a aula e tudo bem. Ninguém aqui vai se preocupar, apesar dessa escola custar os olhos da cara – segundo meu pai.
– Eu não esqueci de planejar a aula, só quero que vocês me digam o que querem aprender hoje – irrita-se o mestre.
– Tá bom vamos parar com essa bobagem, fala em tom exaltado, Emílio – o Galo como é conhecido. Revisa qualquer coisa pois eu preciso de 8 na próxima prova senão tô ferrado.
– Galo isso não tem nada ligado com nota, hoje o tema é livre, e nem vai cair na prova – explica o professor no mesmo tom.
– Pô se não tem nota o que eu faço aqui cara? Retruca Galo, vermelho de raiva.
– Quem sabe se você aprenda algo que goste, somente hoje, só hoje, prometo… implora o professor.
– Ok, quero aprender sobre como é ser professor – responde o baixinho e fanhoso Ludovico – o aluno mais calado da turma e com cara de cientista maluco.
– Obrigado Ludovico por ajudar. É um bom tema. Podemos falar um pouco sobre isso sim.
– Que saco! Grita Galo.
– Mas eu não quero ser professora, diz Mariana com ar de ironia.
– Minha mãe disse que professor é o cara que não conseguiu ser nada na vida, e acabou tendo que dar aulas. Enfatiza outro aluno do fundo da sala.
– Ok, talvez esse seja mesmo um bom tema. Vou falar como é ser professor. Começa o mestre em tom motivado.
– Professor é o cara que tem a função de ensinar aos outros tudo aquilo que, muitas vezes, eles não querem e nem tem interesse em saber. É o cara que tem que aguentar alunos desinteressados, usando esses malditos celulares, enquanto explica, tem que falar mais baixo para não atrapalhar as conversas em grupo dos alunos. No meu caso é um cara que ganha bem, mas em outros pode receber quase nada. Tem aqueles que estudaram muito e que ainda estudam para se manter atualizados, ou tem aqueles que prepararam a sua aula há vinte anos atrás e ainda continuam ensinando os alunos da mesma forma. Existem os professores teóricos, ou aqueles com grande vivência, ou com experiência prática. Existem os que brincam de ser professores, e os que são professores brincando. Alguns chegam a fazer o papel de educadores que os pais e mães deveriam fazer. Alguns apenas ensinam, outros aprendem com o aprendizado dos alunos. Alguns somente se preocupam com as notas, provas, avaliações e, claro, o vestibular. Outros preferem focar nos valores que são passados todos os dias. Alguns são os melhores amigos, outros carrascos, ou megeras, escondidos atrás de uma carapuça de donos do conhecimento e seres superiores. Alguns são dinâmicos e malucos, outros lerdos e chatos. Existe o professor que sabe ouvir. Existe o professor que sabe falar. Existe aquele que não domina nenhuma dessas duas técnicas. Ser professor é ser um aprendiz. Ser professor é ser um ser em constante mutação. Ser professor é olhar para cada aluno como uma possibilidade de crescimento. Ser professor é muito mais do que planejar e dar uma aula, é ser um ser – que recebeu o dom de ensinar outros a aprender, de aprender a ensinar, de aprender a aprender.
Aula encerrada, alunos calados e em estado de reflexão.